O CRIME DA PADARIA
01
Este fato acontecido
Causou muita indagação
Numa cidade pequena
No interior do sertão
Quando um cego saiu
Para comprar o seu pão
02
Era na ponta da cidade
Havia pouco movimento
Única venda do bairro
Que vendia alimento
Seu dono era um surdo
Por nome de Nascimento
03
Era um surdo atencioso
Conhecia toda freguesia
Escrito ou leitura labial
Cada pedido ele entendia
Só os pedido de um mudo
Vez por outra se confundia
04
Naquela monotonia
O tempo ali pairava
O mudo cada vez pior
O cego menos enxergava
E o coitado do surdo
Também menos escutava
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Com o passar dos anos
O bairro foi crescendo
Gente nova na redondeza
Sempre foi aparecendo
E o surdo muito seguro
Sozinho ia atendendo
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Os novatos iam na venda
Alguns só iam uma vez
Outros se adaptavam
Do surdo viravam freguês
Compravam até fiado
Pra pagar no fim do mês
07
Mas a ironia do destino
Transformou a calmaria
Num ente de investigação
Pois um crime acontecia
Na venda do Nascimento
Uma cliente sua morreria
08
O ceguinho e o mudo
Costumava se encontrar
Na venda do Nascimento
Quando lá iam comprar
Sempre no mesmo horário
Sem ninguém combinar
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Num dia infeliz do cão
Um dia pra se esquecer
Se encontrava na venda
Um cego sem poder ver
O mudo sem poder falar
Um ladrão sem nada saber
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Nisto entrou uma cliente
A sua vez ficou esperando
O cego fizera seu pedido
O surdo logo foi pegando
E o mudo por sua vez
Pro o ladrão ficou olhando
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Cinco pessoas na venda
Só uma delas já sabia
O que estava pra acontecer
Na manha daquele dia
Já sabendo o malfeitor
Qual dos quatro morreria
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E o ladrão resolve agir
Grita a todos - é um assalto
Ninguém pode se mexer
Todos com mãos pro alto
A mulher única sadia
Foi correr caiu do salto
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Ninguém mais se mexeu
Só a mulher reagiu
O ladrão botou-lhe a arma
Seu dinheiro lhe pediu
O cego escutou tudo
Mas nada ali ele viu
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O mudo de tanto medo
Deitou-se logo não chão
A mulher se defendendo
Brigando com o ladrão
Recebeu um tiro certeiro
Que acertou seu coração
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A sena ficou estática
Ninguém podia se mexer
O mudo deitado no chão
De medo ainda a tremer
Ao lado daquela mulher
Que acabava de morrer
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O ceguinho ainda esperava
O surdo trazer o seu pão
Quando este apareceu
Viu dois corpos no chão
Sem entender perguntou
O que era aquela arrumação?
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Mas o mudo levantou-se
Sem nada poder dizer
O cego – eu pude escutar
Mas nada eu pude ver
Seu Nascimento atordoado
Ficou sem nada entender
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Chegaram a vizinhança
O tomaram as providencia
Todo mundo assustado
Com tamanha violência
Foram pra delegacia
Pra fazerem a ocorrência
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A policia foi no local
Aquele corpo carregou
Levou para o hospital
Para a família entregou
No cemitério da cidade
No mesmo dia enterrou
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O delegado fez diligência
Iniciando a investigação
Indo ao quesito local
Pra fazer averiguação
Pasmou-se com o que viu
Naquela venda de pão
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Ninguém sabia lhe contar
O que havia acontecido
Mas perguntou a todos
Como ela tinha morrido
Sem ouvir uma resposta
Saiu dali aborrecido
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Vamos para a delegacia
Todos prestar depoimento
Ou todos falam a verdade
Ou vão todos a julgamento
Pelo o crime acontecido
Na venda do Nascimento
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Enquanto isso na pracinha
O assunto virou noticia
Todos lá queriam saber
Qual a atitude da policia
Para descobrir o criminoso
Sem poder fazer pericia
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Para tomar depoimentos
Vieram gente importante
De todos órgãos federais
Veie de lá um representante
Do alto escalão da policia
Veie o maior comandante
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Direitos humano apareceu
Entidades de classe também
Advogados e psicólogos
Enviados sabe lá por quem
Da pracinha pra delegacia
Virou um eterno vaivém
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Enfim todo mundo junto
Naquela sala apertada
Um ventilador girando
Na parede empoeirada
Uma escrivã da capital
Também fora convocada
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A moça já estava suando
A espera dos depoentes
O delegado então chegou
Anunciou os ali presentes
O suor incomodava todos
Era um dia muito quente
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O primeiro depoimento
Foi do dono da padaria
Perguntaram o que houve
Na manha daquele dia
Era pra falar só a verdade
E não negar o que sabia
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Sem nada poder ouvir
O surdo leu tal escrita
Num papel já pregado
Na parede com uma fita
Pensando consigo mesmo
Hora ruim essa maldita
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“De nada eu pude ouvir
Devido minha deficiência
Naquela hora tristonha
Te falo sua excelência
Estava de costa pra eles
Não vi uma violência”
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Do mudo chegou a vez
Ele era muito sabido
A mesma pergunto feita
O que lá tinha acontecido
Sua resposta estava pronta
Num papel já descrevido
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“Seu delegado quase morro
Quando vi o armamento
Não mão de um estranho
Na venda do Nascimento
Me joguei logo no chão
Em total desfalecimento
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Desmaiado nada eu vi
Só um estrondo no ouvido
Sem saber o que houve
Levantei esmorecido
Depois de algum tempo
Naquele chão estendido”
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O delegado impaciente
Sem nada ainda saber
Pensando o que esse cego
Poderá então me dizer
Pode ter ouvido muito
Mas nada ele pôde ver
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Foi repetida a pergunta
Para o ultimo depoente
Veio uma resposta justa
Também bastante coerente
Convenceu o comandante
E os demais ali presente
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“Doutor você me desculpe
O que aqui eu vou falar
Sou deficiente da visão
Nada eu posso enxergar
Mas escuto muito bem
E consigo tão bem falar
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Na venda de meu amigo
Que também é deficiente
Naquele momento horrível
Estava também presente
Mais saiba seu delegado
Nos três somos inocente
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Foi um acerto de contas
Aquele frio assassinato
Aquela mulher bonita
Roubava igual um rato
O matador também era
Um traficante nato
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Pouco tempo por aqui
Eles eram meu vizinho
Pensavam que eu era surdo
Além de ser um ceguinho
Por isso falavam alto
E eu escutava tudinho
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Naquela noite passada
Eu quase não dormia
Ouvindo as acusações
Que de medo eu tremia
Escutei que um ia morrer
Ate o amanhecer do dia
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Reconheci aquela voz
E foi a nossa salvação
Pra livrar meus amigos
De tamanha acusação
Depois do tiro escutei
A carreira do cidadão
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Aqui termino seu delegado
Meu simples depoimento
Lhe faço outra revelação
Ao lado do estabelecimento
Tem um lote abandonado
Lá foi jogado o armamento”
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Naquele mesmo instante
O delegado foi no local
Encontrou uma pistola
Igual a do tiro fatal
Faltava ainda descobri
As impressões digital
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O ceguinho foi aplaudido
Pela sua desenvoltura
Um depoimento sincero
Feito com muita lisura
Não parecia ser autor
Daquela simples criatura
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Todos foram liberados
Daquela fadiga tremenda
Desde cedo sem comer
Não veio uma merenda
Porque estava fechada
Do bairro a única venda
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Mas o caso não terminou
Faltavam ainda as digitais
Que foram para capital
Para as analises finais
E o laudo veio assinado
Pelo legista Thomais
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O resultado surpreendeu
A quem o caso estudou
O ceguinho tinha razão
Quem na pistola pegou
Era um banido perigoso
Que da cadeia escapou
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Com a ajuda do ceguinho
O bandido foi para prisão
O mudo não desmaiou mais
O surdo melhorou a audição
Colocaram nele um aparelho
E continuou vendendo pão.
49
Termino mais uma trama
Fruto da pura imaginação
De quem se propõe a usar
Os caminhos da criação
Com emoção vou vendo
O que vão escrevendo
Os dedos da minha mão
FIM
Eneude Barra Verde
Enviado por Eneude Barra Verde em 27/08/2018